Introdução e Objetivo

Nos últimos anos, dediquei-me a ler e estudar as obras do filósofo Jean-Paul Sartre. Inicialmente, busquei as relações de sua teoria com os acontecimentos históricos da sua época: Sartre escreveu sobre política e marxismo, e, principalmente, sobre a liberdade; e em seus romances, artigos, peças teatrais e cartas, buscou aplicações e exemplos para seus conceitos explorados em seus livros teóricos.

A vida e a obra de Sartre apontam que a liberdade é a máxima determinação humana, que o homem está condenado a ser livre e que não pode existir se não for em liberdade – ainda que muitos sujeitos busquem mascara-la ou subjuguem a liberdade alheia. Sobre esses tópicos, detive-me em um problema específico: como esse conceito pode ser vivido na prática? E como eu, enquanto profissional de Psicologia, posso incorporar esse conceito na clínica psicológica?

O objetivo desse trabalho de revisão bibliográfica é delimitar possíveis implicações clínicas par o conceito sartreano de Liberdade.

Metodologia

Trata-se de uma revisão bibliográfica. Utilizou-se principalmente a bibliografia de Sartre, com ênfase nas obras O ser e o Nada, no qual o autor descreve o que é a liberdade e quais as suas relações e implicações éticas, e Esboço para um teoria das Emoções, obra utilizada para criticar a Psicologia do século XX e apontar novas possibilidades para essa ciência. Para complementar, utilizam-se outros artigos e livros que esclarecem o contexto da época e trazem outros questionamentos pertinentes à Psicologia.

Os dados são analisados de forma qualitativa fenomenológica, buscando conceitos que podem ser futuramente empregados em pesquisas empíricas.

Resultados

A Liberdade defendida por Sartre é uma condição de existência, e embora seu conceito tenha se desenvolvido em um campo ontológico e filosófico, serve de influência para os mais diversos campos. A implicação mais óbvia parece ser a da Ética, visto que a liberdade é criticada por muitos autores, os quais justificam que não é possível haver liberdade absoluta enquanto se prezar pela sociedade – conviver e relacionar-se com os outros é um exercício de controle e repressão dos desejos, como sugeriu Freud na obra O futuro de uma ilusão.

Porém, Sartre abre suas possibilidades para a Psicologia, ao apontar as três relações fundamentais da Liberdade: a intencionalidade, a responsabilidade, e a relação com o Outro. Para Sartre, somos livres porque nossos atos são intencionais, dotados de vontade e intenção, ainda que tentemos agir de má-fé, é apenas através da liberdade intencional que vivemos uma existência autêntica. Ao mesmo tempo, ser livre pressupõe ser responsável pelo que se é e pelo que se escolhe: a liberdade implica que eu me responsabilize pelas consequências das escolhas que fiz. É nesse sentido que Sartre afirma que o homem escolhe a si mesmo, mas que, por isso, está condenado a ser livre. A ideia de condenação exprime que não se trata de um conceito totalmente liberal e inconsequente, mas de uma possibilidade Ética.

Chega-se assim à principal relação da Liberdade: esta só pode se expressar na relação com o Outro, visto que o próprio Ser depende do Olhar do Outro para existir. Dizer que o Outro valida a existência do ser, significa dizer que o Ser vive em liberdade, e que suas escolhas e consequências são visíveis para esse Outro.

Na clínica Psicológica, pode-se entender o Outro como o próprio psicólogo, o qual tem o papel de incitar no paciente ou cliente (o Ser) a responsabilidade por si. Apenas através da responsabilidade intencional, na relação com o Outro, é que o cliente poderá viver sua liberdade, viver sua existência e construir sua essência.

Considerações Finais

Sartre oferece elementos para pensar no homem indeterminado, que faz a si próprio através de suas escolhas e de sua responsabilidade. Combate assim a causalidade e o determinismo, porém, traz também uma dimensão Ética que repercute na clínica psicológica: o homem só é livre se agir de forma intencional, tendo responsabilidade por si, e admitindo sua existência e essência frente ao Outro que o observa.